sexta-feira, 3 de junho de 2011

Cem anos de solidão


Gabriel Garcia Márquez brinca de Deus. Cria um mundo novo, personificado e enclausurado em um pequeno povoado fictício, que segue regras próprias, em uma realidade alheia e ao mesmo tempo, universalizada. E, junto ao seu novo pequeno mundo, Macondo, Márquez narra a saga de cem anos da família de seu fundador, José Arcádio Bundía. Família essa, nas palavras do próprio autor, que representa uma "estirpe condenada a cem anos de solidão".

Tudo é narrado de forma extremamente natural, inclusive as coisas mais fantásticas e impossíveis. Não é à toa que a obra é uma referência em realismo mágico: ninguém se assusta com tapetes voadores, homens que fazem guerras 52 vezes e não se machucam, fantasmas que continuam amigos dos vivos e estão sempre rondando por aí. Por isso mesmo, parece certa - e até justa - a idéia que paira presente desde o início: quem casa com parente tem filho com rabo de porco.

E é essa supertição a alavanca de toda a história. José Arcádio Buendía e sua prima, Úrsula, se casam. Preocupada em ter um filho com rabo de porco, Úrsula se recusa a dormir com o marido, que após dois anos sem conseguir consumar o casamento, se torna motivo de chachota em sua cidade. José Arcádio Buendía acaba, assim, matando um homem que o caçoava e abandona a cidade, atormentado pelo fantasma do assassinado.

Mas José Arcadío Buendía não vai embora sozinho e é acompanhado por vários amigos. Após se perder em terras desconhecidas e fracassar na tentativa de chegar ao mar, o grupo resolve fundar um povoado: Macondo. É em Macondo que irá se desenvolver a linhagem dos Buendía, que tem o destino irremediavelmente ligada à cidade.

Após o nascimento dos três filhos de Úrsula e José Arcádio Buendía, uma entricada teia começa a se desenvolver. Todos tem uma verdadeira vocação para a auto-destruição e para paixões desenfreadas. José Arcádio, Aureliano e Amaranta, os filhos do casal, somados à filha adotiva Rebecca, irão marcar a família, deixando em seus descendentes vícios, supertições, ódios, rancores e a terrível mania de se apaixonar loucamente, inclusive por parentes.

A família que nasce na casa do Buendía é a mais confusa possível. Entre as inúmeras mortes e os multiplicados nascimentos, a família chega a seu apogeu e cai na mais profunda miséria, em compasso com o destino de Macondo. E, em todas as gerações, a fatalidade do destino resolve sempre repetir vícios e hábitos, levando sempre a um grande mal.

Além disso, algo que salta aos olhos é a estranha mania de repetir nomes. Praticamente todos os descendentes recebem o nome de seus antepassados José Arcadio e Aureliano, o que causa repetição de tragédias que, apesar de se repetirem, nunca são iguais.

Úrsula, personagem mais importante e velha da história, norteia o leitor nos mais de cem anos de páginas e o ensina a decorar os vícios dos Buendía. Como única alma com senso, marca todas as gerações e seu fim represennta o maior mau agouro da obra.

Mas os cem anos, as inúmeras gerações e indas e vindas de personagens, ao contrário do que possa parecer, não causam sono ao leitor. Todos os personagens são tão fortes e bem construídos e todos os enredos complexos fluem de forma tão natural, que o livro se torna uma leitura gostosa e simples. E apesar de tantos Aurelianos e José Arcádios diferentes, têm-se a impressão de que todos são um só - e isso pode explicar a familiaridade que sentimos com cada um.

Gabriel Garcia Márquez mereceu o Prêmio Nobel de Literatura, que recebeu em 1982. Criou uma história que ultrapassa a realidade e entra em outra dimensão; e que, ao mesmo tempo, trata da realidade dos países de colonização espanhola. Confundindo realidade com ficção e ficção com magia, o autor consegue criar outro mundo, cheio de significados e lições escondidas.

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